Há cada vez mais empresas a colocar o bem-estar emocional dos profissionais no centro da estratégia de gestão
O diagnóstico dos fatores de risco psicossocial é obrigatório para as empresas, mas não há nada na lei nacional que obrigue a que esta avaliação resulte numa mudança de prática dentro das organizações. Apesar disso, Maria José Chambel, especialista em Psicologia das Organizações e docente da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, garante que “os empregadores nacionais estão mais sensíveis a estas questões e têm demonstrado maior interesse não só em diagnosticar os riscos, como em definir medidas preventivas”.
Os números avançados ao Expresso por Manuel Maduro Roxo, subinspetor geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), confirmam-no. Entre 2014 e 2015, o número de trabalhadores abrangidos por avaliações de risco psicossocial, em empresas nacionais, aumentou de 687.149 para 825.329. Na Europa, os dados disponíveis também confirmam a tendência. O inquérito europeu às empresas sobre Riscos Novos e Emergentes, realizado em 2014 pela Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho, refere que 76% das empresas da Europa-28 realizam periodicamente avaliações de risco. Os problemas psicológicos/emocionais foram identificados por 20,7% das organizações europeias como os mais preocupantes. O estudo avança que a relutância em falar abertamente sobre o tema, é para 30% das empresas a principal dificuldade na gestão dos riscos psicossociais.
PROBLEMAS MAIS DESAFIANTES
Maria José Chambel é regularmente chamada a colaborar com empresas em processos de diagnóstico de riscos psicossociais. O trabalho de excesso, ritmos acelerados e as dificuldades de conciliação entre a carreira e a família são, segundo a especialista, os maiores riscos identificados pelos profissionais portugueses. O culto da “disponibilidade permanente”, hoje prática corrente entre os profissionais, introduziu novos focos de risco psicossocial. “Isto tem custos para as empresas e por isso há cada vez mais interesse em resolver estas questões”, garante a especialista que tal como Manuel Maduro Roxo reconhece que “os problemas psicossociais são muito mais desafiantes e difíceis de solucionar do que os físicos”.
Os dois especialistas reconhecem que, nesta matéria, o foco não deverá ser tratar os profissionais e prepará-los emocionalmente para aguentarem maior pressão e ritmos de trabalhos mais acelerados. A prioridade, garante Maduro Roxo, “deve ser ‘tratar’o elemento agressor”. Ou seja, o modelo de gestão e as práticas seguidos pela empresa. Maria José Chambel chama ainda a atenção para os riscos de “colocar os psicólogos dentro das organizações. A especialista considera positiva a intenção de trabalhar de forma mais intensiva os riscos psicossociais, mas recorda que “a personalização dos casos de profissionais que possam estar a enfrentar problemas do foro psicológico, além de anti-ética pode, em última instância, ser ela mesma um problema se a empresa decidir, por exemplo, que esse profissional passa a ser dispensável em virtude da sua condição”. Assim, para a docente, a identificação destas situações deve ser feita e intensificada, mas o acompanhamento dos profissionais, a ser necessário, deve ser transferido para fora da empresas, de modo a garantir a necessária confidencialidade.