Combater a toxicidade de sentimentos como ansiedade, raiva, frustração, medo e mágoa traz de volta o equilíbrio
A palavra que melhor traduz os tempos atuais talvez seja esta: esgotamento. Estar na vida não é missão fácil, requer os canais abertos para aprender, ensinar, produzir, interagir com o outro e com o ambiente. Como essas demandas só crescem, temos que nos desdobrar na tentativa de responder a todas, com a atenção migrando de foco o tempo inteiro. No final de um dia típico – com dinheiro curto, problemas no trânsito e no trabalho, nas relações com os filhos e com o parceiro –, a sensação é a de ter abrigado doses de ansiedade, impotência e frustração muito maiores do que podemos administrar.
“O stress deixa de ser normal e avança, diminuindo a capacidade de exercer a empatia. Por não vermos as situações com clareza, nos achamos injustiçados”, diz Armando Ribeiro, neuropsicólogo, especialista em stress pela Universidade de Harvard. Esses sentimentos acumulados intoxicam. Produzem o que chamamos de frio na barriga, nó na garganta, aperto no peito, cabeça pesada, além do desânimo, que mina a energia para começar a rotina na manhã seguinte.
Não é exagero comparar os estragos provocados pelos sentimentos envenenados aos prejuízos causados à saúde pela alimentação cheia de açúcares, carboidratos e gorduras. A analogia também pode ser empregada no detox. Assim como precisamos cortar o cardápio inadequado para limpar o organismo, devemos fazer um reset no comportamento, afastando as emoções negativas. “É possível descarregá-las, criando novos hábitos sentimentais”, afirma a psicóloga paulista Mônica Reis de Oliveira. Especialistas apontam medidas de emergência e outras que vão garantir a prevenção da toxina emocional.
1. Desobstrua sua energia
A acupunturista e fisioterapeuta paulista Beatriz Nishimura sugere tocar em três pontos-chave para reduzir o medo, a agitação e a ansiedade. Um deles fica entre os mamilos, sobre o osso esterno. O segundo, no topo da cabeça, no meio da linha entre uma orelha e outra. “Pressione e massageie, um de cada vez, com movimentos circulares, no sentido horário”, explica. Com bolsa de água quente, estimule o terceiro ponto, no centro das costas, na altura das vértebras T3 e T4. Para prevenir a toxicidade dos sentimentos, agulhas podem ser colocadas em vários pontos durante sessões de acupuntura.
2. Reduza a vida digital
Segundo um estudo da Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, publicado em março, acessar Facebook e Snapchat por mais de duas horas diárias dobra o risco de isolamento social. Some-se às evidências o que se vê na prática: amigos rompendo por divergências, casais brigando por ciúmes de likes.
“As redes sociais potencializam a competitividade e as emoções humanas”, explica Ribeiro. Mas não se deve demonizá-las, adverte a psicanalista Fani Hisgail, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo. “Elas trouxeram avanços, permitem interações importantes.” Para usar sem risco de overdose:
• Não leve as redes tão a sério. “O que as pessoas falam de si mesmas ali é sempre da ordem da ficção”, diz Hisgail.
• “Não as busque como refúgio ou antídoto para a frustração nem para preencher um vazio”, recomenda Sylvia Van Enck, psicóloga do programa de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (IPq-HC). É real: Vício em tecnologia abala a qualidade de vida
• Trace metas para os próximos meses, como estabelecer um plano para evolução pessoal ou um trabalho edificante.
3. Neutralize as Notícias
“A realidade alarmante, mesmo que longe, aumenta a percepção de ameaça, o que gera maior secreção de cortisol e adrenalina, hormônios do stress”, diz Ribeiro. O tempo todo ligados à notícia leva ao pânico. Para Hisgail, ataques terroristas e a crise brasileira nos conduzem à sensação de desamparo. Mas isso pode ser evitado:
• Informe-se em boas fontes; evite as sensacionalistas, que só amplificam o mal-estar.
• Diminua a angústia engajando-se em uma causa social. “Pertencer a um grupo que comunga dos mesmos propósitos traz conforto emocional”, explica Josi Conti, editora do site psicologiasdobrasil.com.br.
4. Fim da relação negativa
Se o parceiro inibe suas atitudes e impede seu crescimento, tente encerrar a história. Mas, se é você quem se move pelo ciúme, cuide-se: isso não é amor; trata-se de obsessão, insegurança, autoestima baixa. Para a desintoxicação, a neuropsicóloga Andrea Lorena Stravogiannis, colaboradora do IPq-HC, sugere: “Deixe de pensar que não é boa o suficiente para ele e acredite que pode lutar contra o modelo de amor que aprendeu”. Amar, lembra, é diferente de precisar de alguém. Quando se sentir segura, busque um novo par.
5. Não se deixe influenciar
Tendemos a assimilar comportamentos negativos dos que nos rodeiam. Diz Conti: “Isso desencadeia um ciclo de repetições destrutivas, do qual temos dificuldade de nos livrar”. O bom humor pode mudar, ao longo do dia, pela contaminação das queixas de colegas, por exemplo. Caminhos para não internalizar a influência:
• Desligue o piloto automático que a faz repetir: “Não posso, não dará certo”. As reações químicas são afetadas pelos estímulos enviados ao cérebro. O que falamos melhora ou piora o humor.
• Sorria. O cérebro identifica como verdadeiras as expressões faciais. “Agir como se estivéssemos em certo estado emocional aumenta a força daquela emoção. Mostrar calma, mesmo não a tendo, diminui a agitação”, afirma o psiquiatra Daniel de Barros, do IPq-HC.
6. Estude mais
“É possível aplacar a embriaguez das emoções estudando”, garante Eliane Greice Nogueira, professora de pedagogia da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul. A aprendizagem precisa ser significativa.“Retome o vínculo com um curso inacabado que dava alegria (canto, línguas) e invista na descoberta de novas habilidades.”
7. Saiba o que comer
“O bom cardápio (frutas, legumes, alimentos integrais e não industrializados) ajuda no detox”, afirma Ribeiro. São aliados o café (a cafeína bloqueia a ação da adenosina, substância causadora das reações de stress), o chocolate com 70% de cacau (reduz os níveis dos hormônios do stress) e o chá-verde (o aminoácido teanina, do chá, eleva as ondas alfacerebrais, produzindo relaxamento; associado à serotonina, auxilia no humor).
8. Mexa-se
“Exercícios físicos melhoram a atividade do sistema nervoso central, elevam a autoestima e reduzem sintomas depressivos”, diz a personal trainer Cau Saad, de São Paulo.
9. Inspire e expire
“A respiração é o link entre o consciente e o inconsciente e pode ser usada contra a ansiedade, tristeza ou raiva”, diz Marcia de Luca, colunista de CLAUDIA. Ela ancora os pensamentos no presente. Em posição confortável, respire fundo, traga a atenção para o corpo e observe as sensações. Se alguma distração ou tensão vier à tona, deixe passar. Volte-se para a entrada e a saída do ar. Mantenha a atenção no corpo.
AJUDE-SE
A lista é de Fátima Macedo, diretora da MentalClean, consultoria em saúde emocional, em São Paulo:
1 Faça psicoterapia, coaching e leia muito para se conhecer.
2 No trabalho, alongue-se, faça pausas. Não deixe de lado os prazeres, pressionada por metas a cumprir. Faxine as próprias cobranças.
3 Crie uma “caixinha” de primeiros socorros emocionais. Tire dali as boas lembranças vividas. Elas ajudarão a não levar as emoções negativas adiante.
Fonte: por Fernanda Colavitti para revista Claudia – Fotografia: Congerdesign para Pixabay